Uma pesquisa realizada na UNIFAL-MG identificou uma substância com forte potencial anti-inflamatório para ajudar no tratamento da periodontite – inflamação nas gengivas que pode causar a perda dos dentes. A substância estudada é a tetracarboxiftalocianina de ferro (FeTcPc), derivada de uma classe de compostos químicos conhecida como ftalocianinas.


O estudo, cujo título é Derivado de ftalocianina atenua a produção de TNF-α em cultura de macrófagos e previne a perda óssea alveolar na periodontite experimental, em livre tradução, é parte da dissertação de mestrado da pesquisadora Isadora Breseghello, discente do Programa de Pós-graduação em Ciências Odontológicas da UNIFAL-MG, desenvolvida sob a orientação do docente Marcelo Franchin. O artigo foi publicado no periódico científico Journal of Periodontal Research em 2024.
Em laboratório, os cientistas testaram o composto em células de defesa conhecidas como macrófagos, que estão ligadas à resposta inflamatória do organismo. Eles verificaram que, em determinadas concentrações, o FeTcPc reduziu a produção de substâncias inflamatórias sem causar danos às células.
Na segunda fase do estudo, camundongos com periodontite induzida foram tratados com um gel bucal contendo 1% da substância. O tratamento foi aplicado três vezes ao dia, durante uma semana. Após esse período, os resultados mostraram que o gel ajudou a prevenir a perda óssea e reduziu a expressão de genes relacionados à inflamação na gengiva dos animais.
Além disso, os cientistas investigaram a segurança da substância em testes com larvas de Galleria mellonella e não observaram sinais de toxicidade, o que reforça o potencial do FeTcPc como tratamento seguro.

“Os achados indicam que o FeTcPc pode se tornar uma alternativa terapêutica auxiliar para o tratamento de doenças inflamatórias que causam destruição óssea, como a periodontite”, explica Isadora Breseghello.
Apesar dos resultados positivos, a pesquisadora e ressalta que ainda são necessários novos estudos para entender melhor como o gel é absorvido pelo tecido gengival e como atua diretamente na inflamação.
Outro ponto importante é que o modelo usado em animais não representa completamente a complexidade da periodontite em seres humanos, que envolve muitos outros fatores, como a genética, o sistema imunológico e as bactérias presentes na boca.
Diante disso, estudos futuros deverão avaliar os efeitos do tratamento a longo prazo e em humanos. “Essas investigações são cruciais para aprimorar os resultados terapêuticos e a condução de futuros estudos clínicos em pacientes com doença periodontal”, afirmam os autores.
Além dos avanços científicos, o projeto teve forte caráter colaborativo e formativo. O trabalho integra um projeto maior apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e, em parte, pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), aprovado na chamada MAI/DAI do CNPq, que estimula a parceria entre universidades e empresas para desenvolver soluções aplicadas. A proposta aprovada pela UNIFAL-MG é intitulada: “Estudos pré-clínicos e clínicos de uma formulação contendo PHTALOX® para a prevenção e controle da doença periodontal”.
Para mais informações, acesse o resumo do trabalho pelo link.
Parcerias institucionais e inovação translacional
O trabalho contou com a colaboração dos professores, Pedro Luiz Rosalen – do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Masaharu Ikegaki – Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas, e Leandro Araújo Fernandes – do Programa de Pós-Graduação em Ciências Odontológicas, reunindo competências em estudos in silico (simulações computacionais ou experimentos realizados usando modelos matemáticos e computadores), in vitro (procedimentos realizados em um ambiente controlado como laboratório), pré-clínicos e clínicos, num verdadeiro exemplo de pesquisa translacional”, conta o orientador da pesquisa.

O estudo translacional é um campo da ciência médica que visa acelerar a aplicação de descobertas laboratoriais (do bench, a bancada de laboratório) em benefícios para pacientes no ambiente clínico (o bed, ou leito). “Trata-se de um processo bidirecional: tanto os achados de laboratório geram novas soluções clínicas, quanto as demandas clínicas retroalimentam e impulsionam novas pesquisas básicas”, esclarece o professor Pedro Rosalen, colaborador do projeto.
Marcelo Franchin aponta que o estudo contou também com a contribuição da professora Márcia Regina Cordeiro, do Instituto de Química, que realizou estudos para a elucidação da configuração molecular do FeTcPc, cuja estrutura apresentava lacunas de entendimento na literatura especializada.

“O projeto proporcionou amplas oportunidades de integração acadêmica para os discentes envolvidos”, ressalta o professor, mencionando que três pós-graduandos e três bolsistas de iniciação científica participaram ativamente de colaborações com instituições parceiras como USP, Unicamp, Universidade Guarulhos (UNG), SL Mandic e o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais – Campinas (CNPEN).
Segundo ele, o fato de a chamada exigir a parceria com a empresa possibilitou que a Universidade se aproximasse das demandas clínicas da odontologia por meio da empresa TRIALS – Oral Health & Technologies, sediada em Bauru-SP, representada por Fabiano Vieira Vilhena. “A empresa trouxe à Universidade demandas práticas da clínica odontológica, permitindo uma integração científica e contratual altamente produtiva. Todas as etapas do projeto, incluindo bolsas e recursos, foram honradas pela empresa, mesmo diante de desafios administrativos relacionados à fundação de apoio”, reforça.
Em relação aos possíveis desdobramentos da pesquisa, o professor Pedro Rosalen acrescenta: “Com este estudo, podemos sugerir que o produto analisado tem grande potencial para ser introduzido futuramente na clínica odontológica para o tratamento da periodontite.”

Vitoria Gabriele Souza Geraldine é acadêmica do curso de Medicina da UNIFAL-MG e bolsista do projeto +Ciência, cuja proposta é fomentar a cultura institucional de divulgação científica e tecnológica. A iniciativa conta com o apoio da FAPEMIG por meio do Programa Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia para desenvolvimento.
*Texto elaborado sob supervisão e orientação de Ana Carolina Araújo