Uso de esteroides anabolizantes: conheça as consequências do uso indevido desses hormônios, para fins estéticos, em entrevista com coordenadora do projeto “Se é bomba, um dia ela estoura!”

(Crédito da imagem: Reprodução/Arquivo Pessoal)

O Conselho Federal de Medicina publicou uma resolução que restringe o uso de esteroides androgênicos e anabolizantes para a finalidade estética, ganho de massa muscular e melhora do desempenho esportivo. A fim de abranger a temática, a UNIFAL-MG conversou com a professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Elisângela Monteiro Pereira, coordenadora do projeto “Se é bomba, um dia ela estoura”. Veja o conteúdo completo:

– O que são esteroides androgênicos anabolizantes?

Os Esteroides Androgênicos Anabolizantes (EAA) são um grupo de moléculas que incluem o hormônio testosterona e seus derivados sintéticos. Eles possuem efeitos androgênicos, que são aqueles relacionados às características sexuais secundárias masculinas, e efeitos anabólicos, que estão relacionados ao aumento da síntese de proteínas e, consequentemente, geram o aumento da massa muscular e da força. Dentre os efeitos anabólicos, também podemos considerar o aumento da eritropoiese, que é o processo de produção dos glóbulos vermelhos do sangue, o aumento da retenção de nitrogênio, o aumento da deposição de cálcio nos ossos e a diminuição das reservas adiposas (reservas de gordura).

[perfectpullquote align=”left” bordertop=”false” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]O uso inadequado, abusivo e/ou prolongado dos EAA pode levar a desordens cardiovasculares, endócrinas, neurológicas, gastrointestinais, renais, hematológicas, hepáticas, sexuais, dentre outras, reversíveis ou não, em curto ou longo prazo, a depender das condições de saúde do indivíduo. [/perfectpullquote]

– Como os hormônios mencionados agem no organismo humano no desenvolvimento da massa muscular?

A testosterona pode produzir o efeito de hipertrofia (crescimento) dos músculos esqueléticos de maneira direta, através da ligação e ativação de receptores de androgênios nas células musculares, o que resulta na transcrição de genes envolvidos com a síntese proteica muscular que, no caso, será aumentada. Além disso, a testosterona pode ser transformada em di-hidrotestosterona (DHT) ou em estradiol (E2), que por sua vez medeiam as vias de sinalização responsáveis pela promoção do crescimento muscular.

– Considerando uma pessoa saudável, com dieta adaptada e prática regular de exercícios físicos, recomenda-se o uso desses hormônios para a melhoria de resultados?

Não. Os EAA são da classe dos ergogênicos farmacológicos. Não são considerados ergogênicos nutricionais.

Como ergogênicos nutricionais, podemos citar como exemplos, o Whey Protein, os Aminoácidos de Cadeia Ramificada (BCAA), a creatina, a cafeína, dentre outros. Podem ser usados no pré-treino, durante e pós-treino e auxiliam muito no ganho de massa muscular, na diminuição da gordura corporal, na recuperação da fadiga muscular e na melhoria da capacidade aeróbica. Recomenda-se que sejam usados de maneira individualizada, sob a orientação de um profissional de saúde capacitado.

(Foto: Reprodução/Canva Pro)

– Quais profissionais podem prescrever o uso dos esteroides androgênicos e anabolizantes?

Os EAA estão disponíveis em formulações de uso oral ou injetável, e são consideradas de controle especial no Brasil. Isso significa que a sua dispensação ou venda, para uso humano, estão restritas à apresentação e retenção da cópia da receita de controle especial.

No Brasil, a prescrição de EAA para humanos está autorizada para médicos e cirurgiões-dentistas, nos termos da Lei Federal 9.965/2000. Conforme a Lei, a receita deverá conter a identificação do profissional, o número de registro no respectivo conselho profissional (Conselho Regional de Medina – CRM ou Conselho Regional de Odontologia – CRO), o número do Cadastro da Pessoa Física (CPF), o endereço e telefone profissionais, além do nome, do endereço do paciente e do número do Código Internacional de Doenças (CID), devendo ficar retida no estabelecimento farmacêutico por cinco anos. Outras limitações para a prescrição dessas substâncias surgiram nos últimos anos: Desde 2019, com a publicação da Resolução do Conselho Federal de Odontologia nº 199, de 2019, os cirurgiões-dentistas foram proibidos de realizar terapias denominadas de modulação e/ou reposição e/ou suplementação e/ou fisiologia hormonal fora da área da odontologia. Também foram vedados, pela mesma resolução, de ministrar, promover e/ou divulgar cursos de terapias com as denominações acima mencionadas. Para a classe médica, com a publicação da resolução do Conselho Federal de Medicina nº 2.333, de 2023, ficou contraindicado e vedado, no exercício da medicina, o uso dessas substâncias com a finalidade estética, ganho de massa muscular e melhora do desempenho esportivo. A resolução também regulamenta a prescrição de hormônios divulgados como “bioidênticos”, em formulação “nano”, a prescrição de Moduladores Seletivos de Receptor Androgênico, e ainda, a realização de cursos, eventos e publicidade sobre terapias androgênicas.

– Quem pode tomar os esteroides androgênicos e anabolizantes agora?

Há muitos anos os anabolizantes colaboram com seus benefícios terapêuticos na reabilitação de pacientes após queimaduras, traumas e cirurgias. São indicados no tratamento de condições de hipogonadismo masculino, anemia aplásica, leucemias, osteoporose, disfunções de libido, caquexia (perda da massa muscular) devido à infecção pelo HIV ou por câncer, no tratamento do câncer de mama e, ainda, no tratamento de algumas doenças que geram desenvolvimento atrofiado e baixa estatura, como a Síndrome de Turner, por estimular a síntese do hormônio do crescimento. Segundo a Resolução do CFM nº 2.333, de 2023, a utilização de qualquer formulação de testosterona poderá ocorrer em pessoas com a devida comprovação diagnóstica de sua deficiência, ou em situações regulamentadas por resolução específica.

[perfectpullquote align=”right” bordertop=”false” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]Além dos riscos inerentes aos efeitos adversos e efeitos colaterais dos EAA, o uso sem prescrição é crime, assim como a dispensação dessas substâncias sem a retenção da receita de controle especial. Assim, o indivíduo ou empresa que obtém, dispensa ou colabora com o tráfego ilegal dessas substâncias poderá responder criminalmente.[/perfectpullquote]

– Quais as consequências do consumo elevado dos hormônios?

O uso inadequado, abusivo e/ou prolongado dos EAA pode levar a desordens cardiovasculares, endócrinas, neurológicas, gastrointestinais, renais, hematológicas, hepáticas, sexuais, dentre outras, reversíveis ou não, em curto ou longo prazo, a depender das condições de saúde do indivíduo. O efeito colateral mais comum é o aumento da secreção de glândulas sebáceas, gerando problemas dermatológicos como acne vulgar, alopecia androgênica (perda dos cabelos) e hipertricose (crescimento excessivo de pelos pelo corpo). Também é comum encontrar a associação do uso abusivo de anabolizantes com problemas sexuais, como atrofia (diminuição) testicular, impotência sexual, azoospermia (produção insuficiente de espermatozoides) e infertilidade em homens. Em mulheres, podem produzir engrossamento da voz, alteração no ciclo menstrual, atrofia uterina e aumento do clitóris. Há relatos na literatura científica de que os usuários de EAA, a longo prazo, são propensos a distúrbios psicocomportamentais, como dor de cabeça, irritabilidade, depressão e síndrome de dependência, levando a quadros de violência e até mesmo de suicídio. Pesquisas científicas também apontam associações do uso exagerado dessas substâncias com doenças hepáticas, renais e cardiovasculares.

– Quais os riscos do uso sem prescrição?

Além dos riscos inerentes aos efeitos adversos e efeitos colaterais dos EAA, o uso sem prescrição é crime, assim como a dispensação dessas substâncias sem a retenção da receita de controle especial. Assim, o indivíduo ou empresa que obtém, dispensa ou colabora com o tráfego ilegal dessas substâncias poderá responder criminalmente.

– Conte-nos um pouco mais sobre o projeto “Se é bomba, um dia estoura”, professora!

O Projeto de Extensão da UNIFAL-MG “Se é bomba um dia ela estoura!” tem como principal objetivo conscientizar adolescentes, jovens e adultos em relação aos problemas de saúde que podem ser ocasionados pelo uso inadequado dos recursos ergogênicos, especialmente os anabolizantes. Desenvolvido por uma equipe multidisciplinar, que envolve as áreas da biomedicina, farmácia, medicina e nutrição, nosso plano de trabalho contempla a realização de rodas de conversa, palestras educativas e exposição dos recursos ergogênicos farmacológicos, nutricionais, fisiológicos, mecânicos e psicológicos, com o objetivo de se realizar a troca de informações sobre esses recursos, bem como o levantamento de dados que demonstrem o nível de conhecimento e a utilização de substâncias ergogênicas, especialmente anabolizantes, pelos adolescentes, jovens e adultos do município de Alfenas-MG e região. Através do perfil no Instagram, @projetobomba_unifalmg, também fazemos interação virtual com nossos seguidores, estimulada por postagens e lives, com a presença de profissionais especialistas na temática de cada live. Quem tiver interesse em participar das nossas atividades, ou receber nosso projeto na sua empresa, escola, bairro, etc. pode fazer contato conosco pelo endereço eletrônico seebombaumdiaestoura@gmail.com. Estamos à disposição para dialogar e refletir sobre esse tema com a sociedade.

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