O mês de março aborda a conscientização sobre os cuidados com a saúde renal. Considerando a importância da temática, o Prof. Robson Eugênio da Silva, da Faculdade de Medicina da UNIFAL-MG, concedeu entrevista à Diretoria de Comunicação Social e abordou as principais doenças renais, bem como as formas de prevenção. Leia:
Para começarmos nossa entrevista, pode nos dizer qual é a função dos rins? E por que é importante campanhas de orientação sobre isso?
Os rins são responsáveis por garantir a excreção e a osmorregulação (controle das concentrações de sais nos tecidos e células). São eles que retiram os produtos do metabolismo celular da célula e as substâncias que se encontram em quantidade muito alta no organismo, garantindo, portanto, um equilíbrio dos líquidos corporais.
O rim garante a retirada desses produtos por meio da formação da urina, que ocorre nos néfrons. Nos glomérulos, o sangue encontra-se em alta pressão, o que faz com que uma parte do plasma sanguíneo saia deles e passe para o interior da cápsula glomerular.
Nesse processo, conhecido como filtração, temos a formação do chamado filtrado, bastante semelhante ao plasma. O filtrado, então, segue pelo túbulo néfrico, onde a reabsorção e a secreção de substâncias finalizam o processo de formação da urina.
Por isso é de suma importância campanhas de orientações sobre o bom funcionamento renal e cuidados para garantir este bom funcionamento, que, como dito anteriormente, evitam intoxicações por substâncias que devem ser eliminadas diariamente pela urina.
Quais hábitos do dia a dia podem prejudicar o funcionamento adequado dos rins e trazer riscos para saúde e qualidade de vida das pessoas?
Devemos tomar alguns cuidados para que os rins continuem realizando suas funções. Entre as principais recomendações médicas estão:
– Não consumir sal em excesso;
– Beber a quantidade de água adequada;
– Não fumar;
– Manter o peso ideal;
– Realizar atividades físicas;
– Controlar a diabetes e a pressão arterial.
Além disso, é importante que sejam feitas avaliações periódicas desse órgão, uma vez que a prevenção é o melhor remédio para diversas enfermidades.
[perfectpullquote align=”left” bordertop=”false” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]”O trabalho com a prevenção é essencial, até porque no início da perda da função renal muitos pacientes são assintomáticos.”[/perfectpullquote]
Entre os problemas que o mau funcionamento dos rins, quais são os principais? Quais são as principais doenças renais?
Os principais sintomas de mau funcionamento renal são alterações da cor e aspecto da urina (cheiro, presença de sangue, espuma na urina), aparecimento de edemas no corpo, fadiga, cansaço, anemia, cheiro de urina na boca (hálito urêmico), fadiga e intolerância ao exercício. No caso de problemas renais relacionados a cálculos e infecções, sintomas como dor e febre estão presentes.
No mundo todo, as doenças mais comuns que levam à perda de função renal são as nefropatias hipertensiva e diabética. As doenças primárias do rim (as chamadas glomerulonefrites) são menos comuns, porém, dentre essas, na população adulta, a mais frequente é a nefropatia por imunoglobulina A (IgA). Cálculos, quando se formam repetidas vezes, podem representar problemas do metabolismo renal, inclusive culminando em perda da função do órgão.
O que você indicaria, professor, como cuidados necessários para a saúde dos rins?
O trabalho com a prevenção é essencial, até porque no início da perda da função renal muitos pacientes são assintomáticos. Por isso para manter uma boa função renal, é preciso ter uma dieta equilibrada, evitar excessos de sal, sobrecargas de proteínas, sobrepeso e obesidade, manter um bom controle dos níveis de glicemia e a pressão arterial controlada, não fazer uso de medicações que são tóxicas aos rins (como anti-inflamatórios), ingerir água em quantidades adequadas (2 a 3L ao dia) e avaliar periodicamente os exames que denunciam alterações renais, como a creatinina e o exame de urina.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), estima-se que 1 em cada 10 pessoas, no Brasil, sofra de cálculo renal, acometendo jovens entre os 20 a 35 anos, sendo mais frequente em homens. Como se prevenir contra as “pedras nos rins”, como são popularmente conhecidas? E por que são mais frequentes nos homens?
Para prevenir a incidência das pedras nos rins é preciso adotar alguns hábitos, como aumentar o consumo de água (sendo a melhor forma de evitar a formação dos cálculos), diminuir o sal da comida, fazer atividade física e comer menos carne vermelha. Aumentar a ingestão de sucos cítricos também é uma forma de proteger o corpo da formação de cálculos renais, pois o citrato nestes sucos garante esta proteção. Em relação a maior frequência em homens, sabemos que o fator genético influencia na possibilidade de uma pessoa desenvolver cálculo renal. Por isso mesmo que o histórico familiar não registre um caso, vale a pena seguir uma dieta que torne mais difícil o aparecimento do problema, principalmente homens.
Há uma maior incidência do cálculo renal de acordo com a estação do ano?
O verão é a estação favorita do brasileiro, mas acende o alerta para a alta incidência de pedras nos rins 30% maior que em outros períodos do ano. Isso acontece, pois há o aumento da transpiração sem a hidratação adequada para supri-la, levando a uma desidratação que é um grande fator de risco para formação de cálculos.
[perfectpullquote align=”right” bordertop=”false” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]”O tratamento da insuficiência renal crônica varia e depende do estágio da doença em que o paciente se encontra. Nos casos iniciais, o tratamento pode ser feito por meio de medicamentos e com mudanças na dieta, na busca de desacelerar a progressão da doença.”[/perfectpullquote]
Ouvimos de muitas pessoas que, para evitar as “pedras nos rins”, é recomendado que se beba água e, até mesmo, cerveja. Isso é verdade? A ingestão de pelo menos 2 a 3 litros de água diariamente é a principal forma de proteção contra a formação de cálculos. Quanto a ingestão de cerveja não tem nenhum efeito na formação dos cálculos urinários. Inclusive, assim como todas as bebidas alcoólicas, se for tomada sem a devida hidratação com outros líquidos, principalmente a água, pode levar a diminuir o liquido dentro do rim depois de algumas horas, podendo aumentar a formação de cálculos.
Também, em caso de crise, como se dá o tratamento dos cálculos? O expelir das pedras é algo comum ou sempre é necessário procedimentos para que isso ocorra?
Habitualmente é necessária a ida ao pronto-atendimento para analgesia e controle da dor. Isto é feito através de medicamentos injetáveis de forma intravenosa. Após controle da dor, sugere-se a realização de algum exame radiológico para detectar a causa da cólica renal. O exame mais utilizado é a tomografia computadorizada sem contraste, que permite descrever o local onde a pedra está, o tamanho dela, grau de obstrução no rim e outras informações importantes para decisão de tratamento.
Caso o paciente tenha melhorado completamente da dor, não tem sinais infecciosos e os exames radiológicos demonstrarem que a pedra se encontra em situação passível de ser eliminada (geralmente pedras menores que 6-7 mm, nas porções mais baixas do ureter em direção à bexiga e sem grande dilatação renal). O médico deve monitorar esta pedra até ser eliminada, caso não obtenha sucesso procedimentos invasivos como Litotripsia endoscópica podem ser realizada e em casos extremos (cálculos obstrutivos ou maiores) podem necessitar de cirurgia.
E no caso da doença renal crônica? Qual é o seu tratamento? E qual é o ponto da necessidade de diálise e até de transplante?
O tratamento da insuficiência renal crônica varia e depende do estágio da doença em que o paciente se encontra. Nos casos iniciais, o tratamento pode ser feito por meio de medicamentos e com mudanças na dieta, na busca de desacelerar a progressão da doença.
Nos casos onde a progressão da doença continua de maneira acelerada, não respondendo as medidas medicamentosas, podem envolver a realização de sessões de hemodiálise, um procedimento que filtra, por meio de uma máquina, o sangue do paciente, ajudando a realizar artificialmente parte das funções do rim. Estes pacientes podem conseguir sair das sessões de hemodiálise quando consegue realizar um transplante de rim.
Há casos de pessoas que possuem apenas um rim em funcionamento. Nesse caso, é necessário ter alguns cuidados para ter qualidade de vida?
Mesmo podendo levar vida normal, é importante fazer acompanhamento periódico da saúde renal e seguir hábitos que valem para todo mundo: alimentação equilibrada, não fumar e beber com moderação. Fazer atividade física é uma recomendação médica. Não é necessário seguir uma dieta especial, mas respeitar hábitos saudáveis. O mais importante é evitar o consumo exagerado de sal, sódio (presente em alimentos e bebidas industrializados) e proteínas, principalmente de origem animal (carnes, laticínios, ovos). Em excesso no organismo, eles dificultam o trabalho de filtração dos rins e acabam sobrecarregando o órgão.
Em pacientes hipertensos, essa recomendação é ainda mais importante porque a sobrecarga da função renal pode fazer a pressão subir. Beber bastante água é essencial para facilitar a excreção de líquidos e toxinas.
Uma última pergunta: diferente de alguns órgãos, o rim pode ser doado em vida pelo doador. Esse procedimento é complexo?
No caso de rim de doador vivo, tanto os parentes, quanto os não parentes podem ser doadores, sendo necessária uma autorização judicial. São feitos vários exames do doador para se certificar que apresenta rins com bom funcionamento, não possui nenhuma doença que possa ser transmitida ao receptor e que o seu risco de realizar a cirurgia para retirar e doar o rim seja reduzido.
Então as condições necessárias para ser um doador vivo é manifestar desejo espontâneo e voluntário de ser doador (a comercialização de órgão é proibida). Há a necessidade de ter compatibilidade sanguínea ABO com o receptor. É realizado testes para comprovar outras compatibilidades para evitar a rejeição do rim.
É um processo rigoroso de seleção de viabilidade do órgão até que seja liberado o procedimento cirúrgico do transplante. Uma cirurgia de grande porte que tem os riscos inerentes ao procedimento, mas que tem alto índice de sucesso na maioria dos casos.