Os acadêmicos do curso de Ciências Biológicas (Bacharelado e Licenciatura) da UNIFAL-MG tiveram a oportunidade de participar de um curso prático de taxidermia, ministrado pelo biólogo e taxidermista Daniel Santos de Aguiar, do Museu de História Natural de Campinas-SP. Como resultado, muitos descobriram talento para fazer o tratamento das peças e vislumbraram um diferencial no currículo.
Realizado no laboratório da Coleção Herpetológica do Instituto de Ciências da Natureza (ICN), na Sede da Universidade, o treinamento consistiu no preparo de peças para serem expostas no Museu de História Natural (MHN) da Instituição.
A viabilização do curso ocorreu por meio do projeto “Ensinando Ciências: Interação Museu, Universidade e Escola”, coordenado pela professora Andréa Mollica do Amarante Paffaro (Instituto de Ciências Biomédicas), também diretora do Museu de Memória e Patrimônio (MMP). O projeto foi contemplado no edital 39/2022, referente ao Programa Especial de Difusão e Popularização da Ciência e Tecnologia do Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI). Confira aqui
Conforme o professor Vinícius Xavier (Instituto de Ciências da Natureza), responsável pela Coleção Herpetológica e um dos colaboradores do projeto contemplado, os animais taxidermizados durante o curso fazem parte do acervo de animais levados para a UNIFAL-MG pelas autoridades ambientais. “Esses animais foram encontrados mortos, a maioria por atropelamento, e trazidos à UNIFAL-MG pelo Corpo de Bombeiros ou Polícia Ambiental, ou mesmo depois de morrerem em zoológicos como o de Poços de Caldas”, explica.
Daniel Santos de Aguiar, taxidermista do Museu de História Natural de Campinas-SP, esclarece que a metodologia da taxidermia consiste na retirada e tratamento da pele do animal para fins didáticos e científicos. “A taxidermia foi definida como a arte de preservar ou conservar a pele de um animal para fins didáticos ou científicos”, frisa.
Para ele, a importância da técnica está na possibilidade de reaproveitar os animais mortos para fins de educação ambiental e treinamento de estudantes dos cursos de graduação, visto que os animais seriam perdidos ou simplesmente apodreceriam se não fossem taxidermizados.
Na UNIFAL-MG, o taxidermista ensinou noções de dissecção, anatomia, conservação de pele, órgãos, osteologia, museologia e até comportamento animal, já que as peças são preparadas de modo a mostrar algum aspecto comportamental, como postura, alimentação, movimentação, entre outras.
Segundo o especialista, a taxidermia trabalha as peças artisticamente ou cientificamente. Para que possa ser trabalhado artisticamente, o animal precisa apresentar características de como se ainda estivesse vivo para então compor as exposições nos museus de história natural, o que leva ao revestimento e preenchimento dos espaços nas peças.
No caso de ser destinado aos estudos científicos, o animal passa pelo processo de limpeza de conservação da pele, porém é montado de forma diferente. “Nós fincamos um espeto no animal e ele fica na posição deitada e nós realizamos o tratamento da pele da mesma maneira que faz o artístico para evitar decomposição, então colocamos um algodão no meio e o que mais interessa é ter uma etiqueta nas patas do animal com todas as informações da espécie, nome científico, local encontrado e outras características, para que quando o aluno for fazer a pesquisa científica possa abrir a gaveta e identificar”, detalhou.
Comentando a iniciativa junto à UNIFAL-MG, Daniel Aguiar disse: “O que me deixa muito feliz é que eu vou embora, mas eu deixo não só os animais taxidermizados para exposição, como uma equipe de acadêmicos pronta para que o museu e a própria Universidade possam utilizar seus conhecimentos.”
Cerca de 50 peças foram trabalhadas pelo taxidermista Daniel Aguiar junto ao grupo de acadêmicos das Ciências Biológicas entre os dias 19 e 27 de março.
Taxidermia como uma nova área de atuação para futuros biólogos
Ao relatar a experiência no treinamento, a acadêmica Vivian Ceccon Sergino, do 6º período do curso de bacharelado em Ciências Biológicas, conta que o treinamento permitiu descobrir uma potencialidade desconhecida. “Eu descobri que eu sou muito boa nesse negócio e isso me deu muito ânimo para poder continuar a faculdade”, compartilhou.
“Essa oportunidade que o Daniel está dando com o curso é muito importante porque traz de volta aquele brilho no olho e aquela vontade de continuar. A taxidermia é uma área interessante, é uma área que a maioria não gosta de seguir porque é complicada e às vezes a pessoa não tem afinidade. Se você descobre que tem afinidade então é outro caminho, outra oportunidade de atuação”, disse.
A opinião da discente foi reforçada nas falas dos colegas participantes do curso. Paula Dias, acadêmica do 5º período do curso de bacharelado em Ciências Biológicas, mostrou-se encantada com a possibilidade de aprender na prática como preparar os animais para exposição.
“No começo eu achei que era só para a gente vir, observar e conhecer como é feito, mas aí depois que o Daniel explicou tudo, ele deixou a gente colocar a mão na massa e eu não esperava que iria me encantar tanto”, contou. Segundo a discente, a oportunidade vai permitir um diferencial no currículo. “É uma experiência que pode abrir muitas portas para gente lá na frente”, destacou Paula Dias.
Luiza Liboni de Souza, também do 5º período do bacharelado em Ciências Biológicas, contou que, apesar de trabalhar com mamíferos no estágio, a experiência do treinamento em taxidermia a levou para outro patamar ao ter contato direto com os animais. “Acho que eu encontrei o que realmente curto na Biologia”, afirmou.
“Você estar com um bicho na sua frente e você poder pegar, comparar, como eu fiz, o tamanho da minha mão com a pata do tamanduá, por exemplo, essa parte é mais interessante, e o Daniel me colocou para fazer as pinturas também, então eu estou gostando bastante”, acrescentou.
Para o acadêmico Mateus Ferreira de Souza, do 3º período do bacharelado, participar de todas as etapas de preparação do material é uma experiência única, sobretudo para ele que gosta da área de taxidermia na zoologia de cordados (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos).
“Está sendo uma oportunidade extremamente importante dentro da minha formação, pois pretendo seguir a carreira dentro da zoologia na pós-graduação, então é algo que pode dar uma fundamentação muito grande no desenvolvimento de novos projetos sabendo dessas técnicas”, pontuou.
Segundo Mateus Souza, poder contribuir com novas peças para o acervo do museu tem um sentido especial. “Eu me sinto muito bem em poder contribuir para o museu, porque também sou estagiário do museu com o João [Vitório Rodrigues – coordenador do Biotério Central e diretor do Museu de História Natural] e o Vinícius, e a gente conhece bem os materiais que a gente tem lá”, compartilhou.
“Esse novo material vai servir muito porque agora a gente pode ter esse animal, expor com uma qualidade muito boa e abordar novas questões de conscientização ambiental, principalmente na base, que é a educação infantil”, ressaltou.
A acadêmica Anelise Vieira Rosa Fernandes da Silva, do 6º período da licenciatura, relata que já tinha tido contato com a técnica de taxidermia durante um curso realizado na USP, o que a fez se interessar pela área.
“Eu amei a experiência de lá e fiquei superanimada quando o Vinícius avisou que viria um taxidermista para fazer os animais daqui. Então aqui a gente já fez algumas aves, vai fazer o tamanduá e eu estou amando”, comentou. “A semana tem sido muito produtiva, o Daniel vai abrindo os bichos e vai explicando o passo a passo do porquê que ele está fazendo isso ou aquilo, qual é o procedimento e deixa a gente participar.”
Além de destacar a oportunidade de aprender na prática a técnica de taxidermia, a discente Ana Clara Paiva Zanon, do 3º período do bacharelado, também destacou a possibilidade de aprender com o Daniel. “Ele é um ótimo profissional, orienta a gente e está sempre disposto a ensinar, então nesse primeiro contato com a técnica, achei muito interessante”, disse.
“Sinto que estou cumprindo uma proposta que é ajudar a levar o conhecimento e educação ambiental para as pessoas”, completou.
Prestes a se formar, Laura Bittar dos Santos, do 9º período do bacharelado, contou que desde que entrou na faculdade já gostava da área de taxidermia, no entanto não tinha tido a oportunidade de praticar a técnica. “Eu não esperava que teria essa facilidade de lidar com as carcaças, de fazer a costura, de modelar, de preencher, de você se preocupar se aquele animal vai ficar o mais próximo possível do que seria na natureza”, explicou.
Segundo ela, embora acredite que a técnica possa ser aperfeiçoada, foi interessante perceber que tem dom para a prática. “A gente percebe que tem uma certa facilidade, porque tem pessoas que às vezes não gostam do cheiro, das texturas, então é um teste também, para ver quem se encontra ou não”, relatou.
Laura Santos também pontuou a contribuição que deixará para a Universidade, tendo em vista que as peças serão direcionadas para o Museu de História Natural. “Sinto orgulho de dizer que consegui ajudar com isso. Eu fiz um macuco”, diz. “Fico feliz ver que a peça será exposta e será usada para a educação ambiental. É muito gratificante você terminar o curso e deixar alguma marca sua na faculdade”, afirmou.
O grupo confeccionou aves e mamíferos. Entre as aves, foram taxidermizadas: jacutinga, jacuguaçu, seriema, flamingo, falcão-peregrino entre outras. De mamíferos, a equipe trabalhou: um veado-mateiro, dois saguis, um quati, dois furões e um tamanduá-bandeira.
Vale destacar que a iniciativa também se mostrou inclusiva, tendo em vista que Mateus Souza Soares, estudante cego do curso de Ciências Biológicas (Bacharelado), pôde conhecer algumas das peças prontas através do tato e ouvir as explicações do taxidermista enquanto orientava os demais colegas em treinamento.