
A obra Becos da Memória tem como característica a construção do cotidiano opressivo, o desafio de dialogar através de relatos e uma crônica da apartação social. O lirismo também é característico e importante, pois a autora indaga, como poucos, questões primordiais e impactantes sobre a sociedade brasileira. Conceição traduz a humanidade de forma que o complexo e o mais relevante, é o que coloca à tona os sentimentos mais profundos que a sociedade enfrenta: o desamparo, o preconceito, e os mais temíveis de todos: a fome e a miséria que enfrentam em seu cotidiano.
O público-alvo a ser apresentado para essa obra é bem amplo, pois começa em discentes iniciantes, que têm muitas perspectivas de aprendizado importantes como: questões socioculturais, a convivência em sociedade, estendendo-se também a todo público adepto a uma boa leitura, inclusive leitores internacionais. ‘‘Becos da Memória’’ é um dos mais relevantes romances memorialistas da literatura contemporânea brasileira.
A autora da obra, Maria da Conceição Evaristo de Brito, nasceu em 29 de novembro de 1946. Atualmente, é linguista e escritora afro-brasileira, aposentada, pesquisadora-docente universitária, ganhou o prêmio Jabuti (contos) em 2015 e o prêmio Faz Diferença (prosa) em 2016. Seus trabalhos, situados no âmbito dos estudos de literatura comparada, foram traduzidos para outros idiomas, como inglês, francês e alemão.
Percorrendo os becos da memória de Conceição, vamos entrar em sua ficção-realidade, que será narrada por sua personagem narradora (Maria Nova), que ao crescer na favela mostrará a nós leitores um mundo trágico e ao mesmo tempo doce, vivido por esses personagens, cada qual com sua importância e protagonismo na construção do enredo.
A favela existia lá… com seu aspecto físico natural do ambiente, as lavadeiras com suas roupas estendidas no varal secando. Seguindo assim após uma disputa pela água, já que existia apenas três torneiras: a primeira, que ficava em cima, continha pouca água, a do meio um pouco mais e, a última, que fica embaixo, era farta, porque ali terminava o encanamento total que “supria” a favela inteira. As lavadeiras cantavam ao lavar suas roupas, e seus filhos ali juntos.
Com o passar dos anos, todos continuaram a rotina, que por sinal não era só de fatos tristes, tinham seus momentos de alegrias. Quando o samba tocava no ruído da cuíca, todos se divertiam: dançavam, bebiam e cantavam ali bem perto do perigo: uma cratera que a autora batizara de buracão, era muito fundo e todos ficavam com receio de lá cair por acidente.
Como não bastasse a luta diária do cotidiano de cada membro da comunidade, de súbito chegou o “Bichão Pesado”, termo que a autora usou para denominar os tratores e retroescavadeiras que chegaram ao local para iniciar o desfavelamento. A partir daí, todos ficaram apavorados e perderam sua paz interior, os barracos sendo desmanchados e as pessoas indo embora sem saber para onde. De certa forma, era um alívio na época de chuvas, pois, apesar dos deslizamentos e inundações, o “Bichão Pesado” cessava os trabalhos, mesmo que só por alguns meses. As mortes eram inevitáveis, desde as de causas naturais até as provocadas por questões sociopolíticas, contextos bem presentes no cotidiano da comunidade; a expropriação foi exterminando o ambiente dia após dia.
Conceição Evaristo traz em sua obra uma linguagem muito acessível e de uma delicadeza admirável, para tratar de assuntos tão difíceis e complexos.
Fazendo uma análise de forma sucinta da obra, temos uma perspectiva muito positiva em questão de possíveis desdobramentos sobre a realidade vivida na comunidade. Na atualidade já se encontra novos rumos, e a favela mostra sua dignidade e valores através de sua gente e cultura.
Recomenda-se a leitura desta obra, porque através de “Becos da Memória” surge a certeza de que a favela ou comunidade, como é tratada hoje, irá inspirar novas realidades, e porque não, suscitar novas ficções sobre esse tema.
Paratexto editorial Resenha Crítica, produzido no âmbito da disciplina “Introdução à Editoração”, ministrada pela professora Flaviane Faria Carvalho, em parceria com os projetos +Ciência (FAPEMIG/UNIFAL-MG) e Laboratório de Estudos Editoriais (PROEC/UNIFAL-MG).

Vanuza Helena Brito é estudante do 2º período do curso de Letras/Bacharelado em Língua Portuguesa da UNIFAL-MG. Praticar atividades físicas é um dos seus hobbies favoritos.
Política de Uso
As opiniões expressas nos artigos publicados no Jornal UNIFAL-MG são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem opiniões do Jornal UNIFAL-MG e nem posições institucionais da Universidade Federal de Alfenas. A reprodução de matérias e imagens é livre mediante a citação do Jornal UNIFAL-MG e do autor.