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Em seu primeiro terço, O leitor do trem das 6h27, premiado romance do francês Jean-Paul Didierlaurent que, poucos anos depois de sua primeira edição, já interessou a editoras de 25 países, parece previsível. Ao acompanharmos o dia a dia do operário Guylain Vignolles, temos a impressão de estar diante de uma narrativa distópica cujo protagonista, para compensar a atmosfera opressiva da usina onde trabalha, deixa-se dominar por uma espécie de loucura mansa.

O enredo, porém, começa a complicar-se a partir da explicação do drama de Giuseppe Carminetti, colega de quem Guylain se tornara amigo e que havia perdido as duas pernas num acidente de trabalho. Até aí, temos um relato bastante descritivo: trata-se de fazer o leitor entender como funcionava a máquina chamada sempre de Coisa, por evocar aqueles monstros da ficção científica que, construídos pelo homem, adquirem vida própria e passam a ameaçar seu criador. Esse equipamento é, pura e simplesmente, um potente triturador de papel, consistindo a função de Guylain em cuidar de sua manutenção.

Diariamente, a Coisa tritura muitas toneladas de livros, alguns publicados bem recentemente. Essa descartabilidade tão rápida dos volumes impressos é a primeira ironia do narrador, mas haverá quem não a perceba; trata-se de apontar o dedo para o caráter muito industrial e pouco cultural do mercado livreiro, para o qual, na Europa como no Brasil, importa antes de tudo o lucro – livros não vendidos rapidamente, portanto, deixam as prateleiras e são despejados na máquina para virarem uma pasta da qual se fará o papel destinado a servir de suporte aos sucessos editoriais da próxima temporada.

Guylain Vignolles, no entanto, é um rebelde, apesar de sua condição modesta. Ele aproveita suas entradas na Coisa para subtrair algumas das raras páginas que escapam à destruição. Escondendo-as por baixo da roupa, leva-as para casa com a finalidade de as ler, no curto de trajeto de vinte minutos cumprido diariamente para ir à usina, aos passageiros de seu trem, cuja receptividade, é claro, varia de acordo com o tema, a linguagem e outros aspectos da página da vez.

Chega a ser um pouco monótona essa introdução, mas é uma monotonia instigante porque suspeitamos que terá de haver algo mais. O primeiro ingrediente complicador é a afeição do protagonista pelo colega acidentado; pois Guiseppe Carminetti, ao perder suas pernas, havia decidido “recuperá-las” – mas, como isso se faria? Por meio da compra de todos os exemplares de um livro de horticultura, impresso justamente com o lote de papel reciclado que havia saído da Coisa no dia do acidente. Guylain, por uma solidariedade comovente ao amigo, engaja-se na busca desses livros a ponto de encontrar um jeito piedoso de iludir a esperança deste pelo resto da vida.

Outro ingrediente que acresce mais um nível narrativo é a abordagem de Guylain por duas senhoras, as quais lhe pedem que faça leituras em uma casa onde – logo saberemos – funciona um lar de idosos. Com a inclusão dessa nova camada, o enredo se torna definitivamente engenhoso e surpreendente; as cenas de leitura no asilo acrescentam ao livro uma dimensão humorística ausente da primeira parte, exceto pela ironia do autor qualificando Carminetti como um “ex-bípede” cujas pantufas se haviam tornado “órfãs”.

O humor evolui para uma cena típica de teatro quando, entre os habitantes do lar de idosos, uma ex-professora pede para participar da leitura, cabendo-lhe um trecho pornográfico que apavora Guylain, mas anima sobremaneira o público. Nesse ponto do relato, já entrou em cena um novo elemento, que encaminhará o desfecho: Guylain encontra no trem um pen drive que contém o diário de Julie, zeladora do banheiro de um grande shopping center de Paris.

A partir da leitura desses textos, o protagonista, cuja vida solitária era compartilhada apenas por um peixinho de aquário, vê seus dias ganharem novo sentido. Ele “encontra sua busca”, segundo a bela expressão de Carminetti, o qual retribuirá sua amizade ajudando-o a encontrar Julie. Isso é conseguido por meio da investigação de pistas contidas no manuscrito. Enquanto isso, Guylain substitui, em suas leituras no trem, as páginas aleatórias de livros reciclados por capítulos do diário de Julie. Isso não só equivale, para ele, a uma ressurreição, como também tem efeitos positivos sobre o estado de espírito dos ouvintes.

Dosando sabiamente esses movimentos narrativos em capítulos curtos, o autor nos conduz a um desfecho ao mesmo tempo aberto e feliz: será que os dois solitários (pois Julie também era apaixonada pela leitura e nunca havia encontrado um homem interessante) se unirão e serão felizes?

De qualquer modo, a paixão dos livros terá unido essas duas vidas à deriva num tempo em que o Capital, bem personificado pela Coisa e por seu possuidor, o impiedoso Kowalski, demonstra não precisar mais de ditaduras totalitárias, pois consegue exercer sua perversidade mesmo concedendo aos indivíduos a aparência da liberdade. Afinal, os livros não são incinerados para impedir que propaguem o espírito crítico, como em Fahrenheit 451, o excelente romance de Ray Bradbury publicado em 1951 e transformado por François Truffaut no filme notável com o mesmo título, lançado em 1966. Os livros, em O leitor do trem das 6h27, tornam-se rapidamente inúteis por causa do próprio movimento frenético do mercado – mas salvar uma ou outra página, convém sublinhar, é um ato visto por Kowalski como extremamente subversivo.

Título: O leitor do trem das 6h27
Autor: Jean-Paul Didierlaurent 
Tradução: Adalgisa Campos da Silva
Gênero: Romance
Ano da edição: 2015
ISBN-10: ‎8580577918
ISBN-13: 978-8580577914
Selo: Intrínseca

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