Curso de Filosofia Política: extensão universitária em movimento

Retrato de legislador e poeta Sólon de Atenas. (Imagem: Ilustração de Merry Joseph Blondel)

Na antiguidade grega, durante o século VI antes da era cristã, a democracia surgiu para livrar Atenas de uma crise social profunda que ameaçava levar aquela sociedade à ruína. Seu primitivo modelo surgiu em algumas cidades-estado próximas de Atenas. Mas foi na cidade dedicada à mais famosa filha de Zeus que ela foi eternizada e passou para os anais da história como modelo de governança. Um poeta, Sólon, foi o legislador escolhido. Partiu dele a ideia de adaptar à realidade ateniense o que em muitas outras ilhas já se estava praticando. Ou seja, tentar distribuir o poder, para que um número maior de pessoas pudesse ter papel de decisão nas escolhas citadinas. Entre avanços e retrocessos, sem contar algumas interrupções autoritárias, esse modelo primitivo de democracia durou cerca de 140 anos de prática em Atenas. Se levarmos em conta, o auge da sociedade ateniense, o que provavelmente foi antes da Guerra do Peloponeso (431 a.C. a 404 a.C.), apenas 18,5% da população da cidade votava. O historiador Chester Starr, em seu livro O Nascimento da Democracia Ateniense (Odysseus Editora, 2005), calcula que 43 mil dos 173 mil habitantes estavam autorizados a participar das reuniões do grande conselho. Eles deveriam ser homens, ter mais de dezoito anos e ser filhos de pais atenienses. Critérios que variaram ao longo desse tempo, apresentando algumas nuances, até a derrota de Atenas para Esparta abrir um período em que a cidade foi governada primeiro por seus algozes espartanos e depois por sua oligarquia.

De lá para cá a democracia passou por inúmeros momentos. Se espalhou, mas também chegou a ser apenas um modelo ameaçado de extinção; depois reacendeu, se ampliou, se fortaleceu e se enfraqueceu novamente, a depender do “onde” e do “quando”, o modelo foi operado. Pensar sobre as mais diversificadas manifestações do modelo democrático, suas crises, falhas, valores e sua relação com a realidade atual brasileira tem sido a tarefa de uma equipe ampla e multidisciplinar desde 2019. Juntos, mesmo atuando em diferentes áreas, professores, pesquisadores, ex-alunos e técnicos administrativos em educação da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG) não têm medido esforços para realizar o curso de Filosofia Política desenvolvido no âmbito do projeto Um Livro, Várias Lições.

Registro dos participantes do curso de Filosofia Política no auditório do campus Varginha. (Foto: Arquivo/Lucas Magalhães)

Das muitas mãos que cerraram fileiras e foram importantes nesta história, o destaque é para dois dos idealizadores de primeira hora, o professor Paulo César de Oliveira, do Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL), e o atual reitor da UNIFAL-MG, professor Sandro Amadeu Cerveira. Lado a lado, eles deram consistência institucional à ideia de uma educação em política que fosse autônoma, plural e radicada nos rigores acadêmicos. Na evolução das edições, o professor Fernando Batista Pereira, do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA) foi coordenador por duas edições, uma das quais no delicado momento da pandemia de Covid-19, quando, graças a seu empenho, oportunamente o curso continuou sendo ofertado on-line, fazendo frente a tantas dificuldades. Mais recentemente, a professora Elisa Zwick, vice-coordenadora na quarta edição e, atualmente, coordenadora do projeto; sob seus atentos cuidados o curso ganhou novas parcerias, alcançou financiamento junto ao Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública e Sociedade (PPGPS) e ampliou suas abordagens epistemológicas.

Em suma, foram promovidas quatro e com a edição que se inicia em setembro de 2025, somam cinco as edições desse circuito de aulas que trazem de maneira acessível, a toda comunidade interessada, o pensamento de diversos autores, na maioria deles, considerados clássicos que discutiram as bases do pensamento político ocidental desde a antiguidade grega até a contemporaneidade. Ao longo deste período, mais de 900 alunos inscritos puderam ter acesso a momentos dinâmicos de aprendizado multilateral que foram também privilegiados por espaços de debate aberto sempre com foco no aprimoramento da vivência democrática.

Além das aulas e do rico intercâmbio intelectual, foi dessas atividades pedagógicas que o projeto soma, agora, a publicação de três livros. Eles trazem o conteúdo das aulas de maneira mais aprofundada, com seus temas mais bem problematizados, colhendo de várias fontes bibliográficas discussões e reflexões sobre o que fora trabalhado didaticamente. Em 2021, foi lançado pela Editora Fi, a obra “Um Livro, Várias Lições – questões políticas”; em 2023 não houve edição do curso, mas o ano fora marcado pelo lançamento do livro “Curso de Filosofia Política – a questão democrática” pela editora Dialética. Foi nesse ano também que o projeto de extensão foi representado no “XIV Seminario Internacional Políticas de la Memoria” evento que comemorou os 40 anos de redemocratização da Argentina, em Buenos Aires.

Em 2025, reunido mais uma vez o extrato das aulas, o grupo prepara o lançamento do livro “Democracia: história política e impasses sociais contemporâneos” pela editora Cajuína. No dia 4 de outubro, em Varginha, os autores estarão juntos no encerramento de mais uma edição do Curso de Filosofia Política para apresentar os temas que compõe a obra. Os textos abordam um amplo espectro disciplinar, indo da História à Sociologia, passando pela Administração Pública, pela Filosofia e pela Ciência Política.

Todo esse breve resumo não está imune a dificuldades, pontos fracos e necessidade de aprimoramento. Mas a ideia vive mirando o horizonte de tornar a universidade um espaço aberto, público e convidativo para tentar alcançar dois meta-objetivos: levar formação para além dos muros institucionais e promover uma cultura democrática que possa resistir aos riscos extremistas tão divulgados que flertam com sua danosa supressão.

Referência

STARR, Chester G. O Nascimento da Democracia Ateniense: a assembleia no século V a.C. Tradução Roberto Leal Ferreira. São Paulo. Odysseus Editora, 2005.

Lucas Magalhães Costa é doutorando em História e Culturas Políticas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em História Ibérica pela Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG). Um dos palestrantes no evento +Ciência, sediado no campus sede em Alfenas, em 23 de abril de 2025. E-mail: lc.ara@hotmail.com

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