Pesquisadores da UNIFAL-MG descobriram uma forma de potencializar vacinas usando nanopartículas que estimulam o sistema imunológico. A nova formulação permite reduzir em até 100 vezes a dose do imunizante sem comprometer sua eficácia, o que possibilita aumentar a produção de anticorpos e diminuir os sinais da infecção, como perda de peso e adoecimento. Os testes experimentais foram realizados com poxvírus, um grupo de vírus que inclui o causador da Mpox – anteriormente conhecida por varíola dos macacos.
Esses achados compõem a pesquisa intitulada Uso de Nanopartículas Miméticas a Patógenos como Adjuvante de Resposta Imune em Estratégias de Baixa Dose Vacinal para Poxvirus, que é parte da dissertação de mestrado da pesquisadora Mayra Amoreli da Silveira, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas (PPGCF) da UNIFAL-MG, em parceria com Luiz Cosme Cotta Malaquias, Denismar Alves Nogueira e Carine Ervolino de Oliveira, sob a orientação do docente Luiz Felipe Leomil Coelho. Além dos pesquisadores da UNIFAL-MG, o estudo conta com a colaboração de pesquisadoras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), as professoras Giliane Trindade e Erna Kroon.
Declarada como uma emergência de saúde pública pela Organização Mundial da Saúde (OMS) após desencadear um surto na República Democrática do Congo há alguns anos, a Mpox, doença causada por poxvírus, pode ser prevenida por meio da vacinação.
Apesar de eficazes, as vacinas contra Mpox não estão amplamente disponíveis e enfrentam dificuldades para serem produzidas e distribuídas. Além disso, embora seja altamente efetiva, a vacina mais utilizada contra a enfermidade – composta por um isolado do vírus Orthopoxvirus vaccinia (VACV) atenuado, denominado de Vírus Vaccinia modificado por Ankara (MVA) – ainda encontra desafios para melhorar a sua imunogenicidade, ou seja, a sua capacidade de estimular o sistema imunológico a produzir anticorpos, que são proteínas responsáveis pela defesa do organismo
Enquanto parte integrante do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Poxvírus (INCT POX), o Laboratório de Vacinas da UNIFAL-MG possui como objetivo principal desenvolver novos adjuvantes e estratégias vacinais para a prevenção de doenças causadas por poxvírus, tais como a Mpox e a varíola.
Sob essa perspectiva, pesquisadores desenvolveram e testaram uma formulação de adjuvantes baseada no uso de nanopartículas da proteína albumina bovina, a qual contém uma molécula chamada de Poli I:C, cuja finalidade é investigar se essas novas nanopartículas poderiam tornar viável a redução da dose de antígenos sem comprometer a eficácia da vacina.
“As nanopartículas foram produzidas e analisadas quanto à sua eficácia e segurança em nosso laboratório [Laboratório de Vacinas]. Posteriormente, foi realizado um protocolo de imunização dos camundongos de experimentação, sendo que uma parte dos animais recebeu doses 10 e 100 vezes menores do que a dose padrão e outra parte recebeu as mesmas concentrações de doses do MVA, porém com o acréscimo das nanopartículas”, explicam.
Os animais que receberam as doses mais baixas do MVA, acrescidas ou não das nanopartículas, foram infectados com o VACV, a fim de verificar a eficácia da imunização. Amostras de soro foram coletadas ao longo do experimento, e os animais foram avaliados quanto a sinais clínicos, perda de peso e comportamento. Após o término dos testes com os camundongos, outros experimentos utilizando o material coletado foram realizados, como a avaliação da produção de anticorpos contra o VACV e MVA.
Como principais resultados, foi observado um aumento na produção de anticorpos antipoxvírus em animais imunizados por essa nova formulação vacinal. Também foi evidenciado que os camundongos vacinados com as nanopartículas e baixas doses de MVA apresentaram uma diminuição dos sinais clínicos da infecção, como perda de peso e adoecimento, em comparação com os animais vacinados com as mesmas doses, mas sem o acréscimo das nanopartículas.
“Em outros trabalhos do nosso grupo de pesquisa, já era conhecido que as nanopartículas agem como imunoestimulantes por simularem patógenos. Porém, essa característica ainda não tinha sido avaliada no contexto de MVA. Também já era sabido que doses de MVA inferiores à dose atualmente utilizada em vacinas não eram capazes de gerar proteção adequada contra os poxvírus. Este trabalho mostra que, ao se adicionar as nanopartículas, o MVA, mesmo em doses mais baixas, tem a capacidade de diminuir sinais clínicos e perda de peso frente a uma infecção por poxvírus”, salienta Mayra Silveira.
Segundo os autores, essa abordagem de dose-economia poderia permitir maior cobertura vacinal com menor quantidade de insumo, contribuindo de forma estratégica para o enfrentamento de surtos, epidemias ou pandemias de poxvírus.

“Ao potencializar a resposta imune das vacinas de poxvírus atenuados em baixas doses, as nanopartículas proporcionam uma possibilidade de aumentar a produção de vacinas contra doenças causadas por poxvírus, pois uma mesma quantidade de MVA utilizada para produzir as vacinas atuais poderia produzir um número muito maior de doses (10 ou 100 vezes mais). Isso diminui o preço de custo e, consequentemente, torna a vacina mais acessível, barata e com potencial para ser amplamente distribuída aos grupos de pessoas que mais necessitam dela, sobretudo em países em desenvolvimento. Além do mais, as nanopartículas têm um baixíssimo custo, o que torna essa tecnologia ainda mais promissora para ser aplicada em larga escala”, destacam.
De acordo com os estudiosos, a estratégia é relevante nas emergências globais em saúde pública, nas quais é necessário vacinar inúmeras pessoas em menor tempo possível, considerando que nem sempre a quantidade de doses disponíveis supre a demanda de todas as populações vulneráveis.
Atualmente, análises adicionais estão sendo realizadas com o intuito de confirmar a eficácia e a segurança da nova estratégia antes de avançar para etapas futuras. “Os pesquisadores estão analisando, em detalhes, os pulmões dos animais imunizados, para verificar os efeitos da proteção vacinal nos tecidos. Além disso, em parceria com a UFMG, estão conduzindo testes de soroneutralização, os quais avaliam se o soro dos animais vacinados é capaz de bloquear tanto o vírus Vaccinia quanto o vírus Mpox”, esclarece Luiz Felipe Coelho.
Este trabalho recebeu financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq-INCT POX), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da UNIFAL-MG.

Vitoria Gabriele Souza Geraldine é acadêmica do curso de Medicina da UNIFAL-MG e bolsista do projeto +Ciência, cuja proposta é fomentar a cultura institucional de divulgação científica e tecnológica. A iniciativa conta com o apoio da FAPEMIG por meio do Programa Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia para desenvolvimento.
*Texto elaborado sob supervisão e orientação de Ana Carolina Araújo