Grupo de pesquisa desenvolve tecnologia nacional inédita que promete popularizar o ‘açúcar do bem’

Pesquisadores da UNIFAL-MG e de instituições parceiras criam método inovador para produzir fruto-oligossacarídeos (FOS) a partir da sacarose da cana-de-açúcar, o que reduz custos e diminui a dependência de importações
PLA [Poliácido Láctico - tipo plástico biodegradável] impresso em 3d para imobilização das células fúngicas. (Foto: Arquivo/Grupo de pesquisa)

Um grupo de pesquisa UNIFAL-MG, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química e com a colaboração de instituições parceiras, está perto de mudar o cenário da produção de fruto-oligossacarídeos (FOS), conhecidos como o ‘açúcar do bem’. Hoje 100% importado, esse tipo especial de açúcar pode, em breve, ser produzido no Brasil a preços mais acessíveis a toda população.

Rafael Firmani Perna – professor da UNIFAL-MG e líder do grupo de pesquisa. (Foto: Arquivo Pessoal)

Segundo os pesquisadores, os FOS são açúcares com propriedades funcionais: têm baixo valor calórico, são indicados para diabéticos, não causam cáries e atuam como prebióticos, servindo de alimento para as bactérias benéficas do intestino humano. Além disso, estudos apontam efeitos positivos na prevenção do câncer de cólon e no tratamento de doenças como anemia e hipertensão.

“Queremos colocar no mercado um açúcar de baixo custo, competitivo e que possa atender principalmente pessoas com doenças metabólicas, como o diabetes”, explica o professor Rafael Firmani Perna, líder do grupo de pesquisa e coordenador do Laboratório de Tecnologia Enzimática e Bioprocessos da UNIFAL-MG.

Para os autores, apesar dos benefícios, o Brasil não produz FOS. Todo o consumo nacional depende de importações, o que encarece o produto e restringe sua presença no mercado. O preço atual é de cerca de US$ 165 por quilo, inacessível para a maioria da população. O cenário global, no entanto, mostra um mercado em expansão: em 2024, o setor movimentou US$ 3,85 bilhões e deve chegar a US$ 6,25 bilhões até 2029, com taxa de crescimento anual de 10,19%.

A inovação brasileira

Pesquisadora cultivando o fungo. (Foto: Arquivo/Grupo de pesquisa)

O grupo apostou em duas frentes para viabilizar a produção nacional: usar a sacarose, oriunda da cana-de-açúcar, como matéria-prima – abundante e barata no país – e adotar um processo contínuo com reatores de leito fixo (PBR).

Para converter a sacarose em FOS, foi necessário um biocatalisador específico: uma enzima produzida pelo fungo Aspergillus oryzae IPT-301. “Esse fungo é o único capaz de produzir a enzima adequada para transformar, potencialmente, a sacarose em FOS”, detalha o professor Rafael Perna.

O desafio seguinte foi tornar as células mais resistentes no processo produtivo. A solução veio com a engenharia de bioprocessos: os cientistas usaram poliácido lático (PLA), um plástico biodegradável e reciclável, para criar estruturas 3D que imobilizam os micro-organismos. Isso aumentou a estabilidade operacional das células e garantiu uma produção mais eficiente e sustentável do açúcar prebiótico. Segundo o professor, o grupo já alcançou uma produção de aproximadamente 160 g/L.h de FOS em escala laboratorial, um resultado promissor que foi validado por estudos de viabilidade técnico-econômica realizados pelo grupo de pesquisa.

Próximos passos

Reator de leito fixo. (Arquivo/Grupo de pesquisa)
Início da reação utilizando o impresso 3d de PLA em reator de leito fixo. (Arquivo/Grupo de pesquisa)

O grupo já alcançou a produção de FOS em solução e agora avança nas etapas de recuperação e purificação do bioproduto, visando atender tanto à indústria alimentícia quanto à farmacêutica. A expectativa é que o ‘açúcar do bem’ nacional esteja disponível no mercado em até oito anos. “A equipe está totalmente focada no desenvolvimento das etapas de recuperação e purificação do FOS, que são fundamentais para o processo, representando até 70% dos custos de produção do açúcar prebiótico”, afirma o pesquisador.

E a pesquisa não deve parar por aí. Segundo Rafael Perna, a mesma tecnologia poderá ser aplicada na produção de outros compostos de alto valor agregado, como ésteres de açúcares, usados em cosméticos para tratamentos dermatológicos.

 

Colaborações nacionais e internacionais e apoio financeiro

Parte dos pesquisadores que fazem parte da rede de colaboração. (Foto: Arquivo/Grupo de pesquisa)

A rede de pesquisa conta com parcerias nacionais e internacionais, incluindo laboratórios da Universidade Federal do Tocantis (UFT, Campus Palmas-TO), da Universidade Estadual Paulista (UNESP, Campus São Vicente-SP), do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT, São Paulo-SP) e do Centro de Engenharia Biológica da Universidade do Minho, em Portugal.

Nos últimos anos, o trabalho foi apoiado por oito projetos financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – FAPEMIG (Processos APQ-00793-24, BPD-00030-22, APQ-00085-21 e APQ-02131-14) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) do Governo Federal (Processos 305029/2024-0, 408302/2023-2, 404912/2021-4 e 421540/2018-4).

Para mais informações sobre o projeto, acesse o Instagram do Laboratório de Tecnologia Enzimática e Bioprocessos da UNIFAL-MG neste link.

Confira também informações sobre os laboratórios parceiros: Laboratório Micobio-Nanotec – UNESP/Campus São Vicente-SP e Laboratório de Instrumentação Científica – UFT/Campus Palmas-TO

Rafael Martins da Silva Afeto é mestrando em Ciências Ambientais na UNIFAL-MG e bolsista do projeto +Ciência, cuja proposta é fomentar a cultura institucional de divulgação científica e tecnológica. A iniciativa conta com o apoio da FAPEMIG por meio do Programa Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia para desenvolvimento.

*Texto elaborado sob supervisão e orientação de Ana Carolina Araújo

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