Pesquisadores da UNIFAL-MG, vinculados ao Laboratório de Biologia Molecular de Microrganismos (LaBioMol), identificaram uma estratégia de desenvolvimento de vacinas para o HKU5-CoV-2 — um novo coronavírus detectado em morcegos. Os achados foram publicados na revista Signal Transduction and Targeted Therapy (STTT), do grupo Nature, um dos periódicos científicos mais influentes da área biomédica global, com fator de impacto 40,8. O artigo foi classificado como Research Highlight, reconhecimento reservado a estudos de grande relevância internacional.

Coordenado e orientado pelo professor Leonardo Augusto de Almeida, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB), o projeto conta com a professora Patrícia Paiva Corsetti, também do ICB, na coordenação adjunta, e envolve acadêmicos da pós-graduação. O primeiro autor do artigo é Leonardo Pereira de Araújo, discente de mestrado do Programa de Pós-Graduação Multicêntrico em Ciências Fisiológicas (PPGMCF). Também assinam o estudo, os doutorandos Evandro Neves Silva e André Luiz Calliari Costa, ambos vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas (PPGCB).
A estratégia de desenvolvimento de vacinas proposta pelos pesquisadores é baseada na identificação de epítopos conservados (regiões específicas das proteínas virais reconhecidas pelo sistema imunológico) em proteínas estruturais do novo coronavírus HKU5-CoV-2. “Este vírus chamou a atenção da comunidade científica internacional no início de 2025 devido à sua capacidade de se ligar ao receptor ACE2 humano, o mesmo utilizado pelo SARS-CoV-2 para infectar células humanas”, conta o coordenador do projeto.
Segundo Leonardo Almeida, a descoberta do vírus foi amplamente divulgada em veículos de comunicação como Reuters, The Sun e The Economic Times, que destacaram o potencial risco de transmissão zoonótica direta para humanos. Como resposta à ameaça emergente e à ausência de ferramentas diagnósticas ou vacinais específicas, o grupo de UNIFAL-MG desenvolveu a abordagem preventiva no LaBioMol, com apoio financeiro de agências de fomento como CAPES, CNPq e FAPEMIG.
“Esse trabalho é consequência de um projeto desenvolvido em 2021 com apoio institucional no combate à COVID-19, em que tivemos um projeto aprovado no âmbito da Chamada 02/2020 – Edital PRPPG/Reitoria, o qual produziu dados essenciais para o desenvolvimento de novos trabalhos”, compartilha o coordenador.
Entre os resultados mais relevantes, o grupo identificou uma região conservada, ainda não explorada, na proteína Spike. Tal região pode ser utilizada para o desenvolvimento de vacinas capazes de prevenir a infecção por esse vírus e outros da mesma família. A equipe também encontrou epítopos conservados em outras proteínas virais, o que reforça o potencial da abordagem para desenvolvimento de vacinas de amplo espectro e ferramentas diagnósticas eficazes.
Para o professor Leonardo Almeida, o trabalho do LaBioMol representa um avanço significativo na preparação para futuras ameaças pandêmicas. “Esse trabalho é de extrema relevância para o avanço científico no campo da imunologia aplicada e no enfrentamento de vírus emergentes e reemergentes, como é o caso do HKU5-CoV-2. O fato de termos identificado, aqui no Brasil, na UNIFAL-MG, epítopos conservados com potencial uso em vacinas e testes imunodiagnósticos para um vírus detectado do outro lado do planeta, demonstra não apenas a competência técnica da nossa equipe, mas também a capacidade da ciência brasileira de oferecer respostas rápidas e globais a ameaças pandêmicas.”
Abordagem diferenciada
A metodologia adotada pelos pesquisadores segue a mesma linha de pesquisa validada pelo grupo em um estudo anterior, publicado na revista The Lancet Microbe (2024), sobre os vírus Mpox e Alaskapox, que teve ampla repercussão nacional. Veja aqui

Utilizando ferramentas avançadas de bioinformática e imunoinformática, os pesquisadores analisaram a proteína Spike e também as proteínas envelope, membrana e nucleocapsídeo do HKU5-CoV-2. Mesmo com 77 mutações identificadas na proteína Spike, uma região altamente conservada — entre os aminoácidos 750 e 1200 — revelou grande potencial antigênico.
As sequências das proteínas estruturais do novo vírus foram obtidas de bancos públicos (GenBase) e os epítopos previamente mapeados no SARS-CoV-2 foram alinhados com as proteínas do HKU5-CoV-2.
As análises computacionais e experimentais foram conduzidas com infraestrutura própria do LaBioMol, que atua na interface entre microbiologia, imunologia e biotecnologia, com um de seus focos no desenvolvimento de vacinas, diagnósticos e estratégias de vigilância genômica voltadas para agentes infecciosos emergentes e reemergentes.
“No LaBioMol, desenvolvemos uma estratégia ágil e eficiente de triagem e análise imunoinformática para identificar candidatos vacinais e diagnósticos com alto potencial imunogênico. Essa abordagem permite acelerar significativamente o desenvolvimento de vacinas e testes, especialmente voltados a grupos de risco como imunocomprometidos, gestantes e idosos, já que não utilizamos o vírus atenuado, mas sim pequenas regiões altamente específicas e seguras de suas proteínas estruturais”, conta.
O diferencial do trabalho do grupo está na integração entre ciência de fronteira, rapidez metodológica e compromisso com a saúde pública. “Este trabalho reforça o papel da UNIFAL-MG como protagonista na pesquisa de impacto internacional e reafirma o potencial transformador da ciência nacional quando há investimento, dedicação e visão estratégica”, ressalta.
Reconhecimento e próximos passos
O artigo sobre a estratégia foi submetido à revista Signal Transduction and Targeted Therapy em março, revisado em abril e aceito no mesmo mês, o que demonstra a relevância científica do trabalho. A publicação está disponível gratuitamente no portal da revista neste link.
Conforme o pesquisador, o projeto segue em andamento, com a próxima etapa voltada à validação experimental da imunogenicidade dos epítopos identificados, visando sua aplicação em futuras plataformas vacinais e estratégias de vigilância para prevenção de novas pandemias.
“A expectativa da equipe é que os dados gerados neste estudo contribuam com estratégias globais de vigilância genômica, subsidiem o desenvolvimento de vacinas preventivas e fortaleçam o preparo científico frente a futuras pandemias”, finaliza.
Acesse o artigo publicado aqui