A integração de resíduos da pecuária com subprodutos da cana-de-açúcar pode aumentar significativamente a produtividade de biometano em biorrefinarias. Isso é o que aponta um estudo coordenado pela professora Renata Piacentini Rodriguez, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da UNIFAL-MG, em parceria com a Usina Cocal.
Realizada em 2024, a investigação ocorreu em etapas, começando com testes em laboratório (escala de bancada) para avaliar o desempenho da codigestão de diferentes tipos de resíduos como vinhaça (subproduto da cana-de-açúcar), materiais lignocelulósicos e dejetos da pecuária. A inovação metodológica está na utilização de um sistema de digestão anaeróbia em duas fases — uma voltada para a quebra inicial dos compostos orgânicos (fase acidogênico-sulfetogênica) e outra destinada à produção de biometano (fase metanogênica).

A equipe de pesquisadoras também desenvolveu tecnologias limpas para o pré-tratamento dos resíduos lignocelulósicos — mais difíceis de degradar — utilizando fungos decompositores conhecidos como fungos de podridão branca, como o Shimeji. Esses microrganismos são capazes de quebrar estruturas resistentes presentes no bagaço e na palha da cana, promovendo maior eficiência energética no processo. Diferentemente dos métodos convencionais, que exigem grande consumo de energia ou insumos químicos e geram resíduos secundários, o pré-tratamento biológico não deixa subprodutos e se destaca por seu baixo impacto ambiental.
“Nosso objetivo central é integrar a geração de bioenergia a partir dos resíduos do etanol, açúcar e da pecuária, dentro do conceito de biorrefinaria — um sistema que promove o aproveitamento sinérgico de resíduos de diferentes setores para a obtenção de bioenergia e bioprodutos”, destaca a professora Renata Rodriguez.
Conforme a pesquisadora, a integração desses resíduos representa uma alternativa ambientalmente sustentável aos combustíveis fósseis, uma vez que contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa e para o cumprimento das metas de neutralidade de carbono até 2050. O biogás gerado é uma fonte energética limpa e versátil, com aplicações térmicas, elétricas e como combustível veicular, podendo substituir o gás natural sem necessidade de adaptações técnicas. A tecnologia também favorece o aproveitamento de resíduos agropecuários, possibilitando geração de renda e uso energético direto por pequenos produtores.
A integração de resíduos do etanol, açúcar e da pecuária representa uma alternativa ambientalmente sustentável aos combustíveis fósseis. (Fotos: Arquivo/Renata Rodriguez)
“Aproveitar os resíduos agropecuários significa transformar o que antes era descartado em algo útil, como energia para uso próprio ou até mesmo uma nova fonte de renda. Isso mostra como inovação e responsabilidade ambiental podem andar juntas no meio rural”, ressalta a docente.
Após os testes laboratoriais, a equipe pretende replicar os experimentos em escala piloto, aproximando o processo das condições reais de operação em usinas. Também está previsto o aprofundamento das análises econômicas, energéticas e ambientais do sistema, incluindo o estudo de ciclo de vida da tecnologia, para avaliar sua viabilidade e sustentabilidade no longo prazo. Os resultados poderão orientar políticas públicas, atrair investimentos e viabilizar parcerias com empresas interessadas em adotar o modelo.
Além da colaboração da Usina Cocal, que oferece suporte técnico e infraestrutura para a realização dos testes em campo, a pesquisa é financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do Edital 18/2022, com recursos na ordem de R$ 750 mil.
Pesquisadoras que integram a equipe:
(Fotos: Arquivo/Renata Rodriguez)

Mariana Cassiano Ribeiro é jornalista e bolsista do projeto +Ciência, cuja proposta é fomentar a cultura institucional de divulgação científica e tecnológica. A iniciativa conta com o apoio da FAPEMIG por meio do Programa Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia para desenvolvimento.
*Texto elaborado sob supervisão e orientação de Ana Carolina Araújo