Estudo identifica florestas em regeneração na Mata Atlântica como as mais vulneráveis ao fogo

Análise de mais de 40 mil incêndios ao longo de 35 anos aponta necessidade urgente de proteger vegetação secundária
A imagem ilustrativa mostra a foto de um incêndio florestal com chamas intensas em tons de laranja e vermelho consumindo vegetação seca, em contraste com a vegetação verde no primeiro plano.
Imagem ilustrativa. (Foto: Reprodução/Canva Education)

As florestas secundárias — aquelas em processo de regeneração — são mais suscetíveis a incêndios na Mata Atlântica. Isso é o que aponta uma pesquisa desenvolvida por Bruno Adorno, biólogo e mestre em Ciências Ambientais pela UNIFAL-MG, doutor em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). O estudo, que analisou mais de 40 mil eventos de fogo registrados ao longo de 35 anos, contou com a colaboração da professora Érica Hasui, do Instituto de Ciências da Natureza (ICN) da UNIFAL-MG.

Bruno Adorno – biólogo e mestre pela UNIFAL-MG desenvolveu o estudo no doutorado realizado na UFSCar, o qual contou com a colaboração da professora Erica Hasui, da UNIFAL-MG. (Foto: Arquivo Pessoal)

Utilizando mapas de uso do solo e de cicatrizes de fogo em ambientes como plantações, pastagens e formações florestais, os pesquisadores aplicaram um índice de proporções para caracterizar os incêndios e determinar onde ocorrem. Esse método, segundo Bruno Adorno, considera não apenas a quantidade de área queimada em cada tipo de ambiente, mas também o quanto daquele ambiente existe na paisagem.

“Se um tipo de floresta ocupa uma pequena parte da região, mas concentra muitos focos de incêndio, isso indica uma vulnerabilidade maior. Ou seja, analisamos o risco de fogo levando em consideração tanto a área queimada dentro de cada ambiente quanto a disponibilidade daquele tipo de ambiente na Mata Atlântica”, exemplifica.

Conforme o pesquisador, essa abordagem é utilizada em regiões do Mediterrâneo e a proposta de aplicá-la no contexto brasileiro representa algo inédito. “A abordagem nos permite entender se os incêndios estão acontecendo de forma aleatória ou se há uma espécie de ‘preferência’ do fogo por determinados ambientes — o que ajuda a identificar quais áreas são mais vulneráveis e podem estar sob maior pressão”, acrescenta.

Como resultado, os pesquisadores identificaram que a vulnerabilidade ao fogo varia bastante entre os diferentes ambientes estudados. “Florestas maduras se mostraram mais resistentes ao fogo, enquanto as florestas secundárias — aquelas em processo de regeneração — apresentaram maior vulnerabilidade”, relata Bruno Adorno.

Mapas de uso do solo e de cicatrizes de fogo foram utilizados pelos pesquisadores para aplicar um índice de proporções. (Imagem: Reprodução/Bruno Adorno)

Tal achado apresenta implicações importantes tanto por revelar que essas áreas em regeneração estão extremamente suscetíveis ao fogo — o que pode comprometer seriamente os esforços de restauração da Mata Atlântica — quanto pelos indícios preocupantes de que essas áreas estejam sendo intencionalmente incendiadas para impedir que avancem para estágios mais maduros de sucessão ecológica. “À medida que as florestas se tornam mais antigas e estruturadas, passam a ser mais protegidas pela legislação ambiental”, ressalta.

Os resultados apresentam impactos práticos para o manejo do fogo e podem contribuir diretamente para políticas públicas de prevenção a incêndios e restauração florestal. De acordo com o pesquisador, uma das principais sugestões é que as paisagens agrícolas sejam planejadas de forma estratégica, colocando áreas com menor propensão ao fogo próximas das mais vulneráveis.

“Essas zonas de menor risco funcionariam como barreiras naturais, ajudando a conter o avanço do fogo e protegendo os ambientes mais sensíveis. Também ressaltamos a importância do manejo adequado das áreas agrícolas, com ações como a manutenção de aceiros (faixas sem vegetação que impedem a propagação do fogo) e a remoção de capins exóticos, que são altamente inflamáveis e muitas vezes invadem áreas de vegetação nativa”, detalha, reforçando que tais medidas simples podem reduzir significativamente tanto o risco de ignição quanto a propagação dos incêndios.

Implicações no contexto das mudanças climáticas

Pelo fato da pesquisa apontar que as florestas secundárias são as mais vulneráveis ao fogo, também reforça uma preocupação no contexto das mudanças climáticas, uma vez que essas florestas têm um grande potencial de crescimento, o que pode ocasionar no acúmulo de carbono na atmosfera ao longo do tempo. “Se essas áreas forem protegidas do fogo, elas podem continuar seu processo de regeneração e se tornar importantes aliadas no sequestro de carbono, ajudando a mitigar os efeitos do aquecimento global”, comenta o pesquisador.

Para Bruno Adorno, as próprias medidas de prevenção e controle de incêndios também podem contribuir diretamente para a mitigação climática. “O fogo, ao queimar a vegetação, libera grandes quantidades de carbono para a atmosfera. Ou seja, evitar que o fogo ocorra — especialmente em áreas em regeneração — é uma forma eficiente de manter o carbono estocado nas florestas e fora da atmosfera”, destaca.

Grupo responsável pelo estudo

Érica Hasui – professora do Instituto de Ciências da Natureza da UNIFAL-MG – foi orientadora de Bruno Adorno na graduação e mestrado, e colaboradora do estudo no doutorado do pesquisador. (Foto: Arquivo Pessoal)

A proposta do estudo nasceu durante o doutorado do biólogo na UFSCar, sob a orientação do professor Augusto João Piratelli, mas contou com o apoio da professora Érica Hasui da UNIFAL-MG. “Fiz minha graduação em Ciências Biológicas e também o mestrado na UNIFAL-MG, ambos sob orientação da professora Érica Hasui. Nossa parceria acadêmica começou nessa época e continuou ao longo da minha formação. Durante o doutorado, ela contribuiu ativamente para a concepção e o planejamento do estudo”, comenta o pesquisador.

Além da parceria com a professora da UNIFAL-MG, a pesquisa envolveu também o professor Milton Ribeiro, da UNESP, e o pesquisador Pedro Vaz, da Universidade de Lisboa, em Portugal. “Essa colaboração internacional e interdisciplinar foi fundamental para enriquecer o trabalho”, afirma Bruno Adorno.

E a pesquisa não para por aí, uma vez que o grupo quer aprofundar a investigação sobre como as florestas secundárias respondem ao fogo ao longo do tempo. Segundo o pesquisador, a ideia é analisar se a vulnerabilidade observada está relacionada a fatores como o clima local, a idade da vegetação, o tipo de solo, entre outros.

“Já temos um trabalho de mestrado em andamento, orientado pela professora Érica Hasui e coorientado por mim, que busca justamente responder essas questões. Esse estudo vai nos ajudar a entender melhor os mecanismos por trás da vulnerabilidade ao fogo e, com isso, a propor estratégias mais eficazes para a conservação e recuperação dessas áreas tão importantes para a Mata Atlântica”, revela Bruno Adorno.

Para ler o artigo na íntegra, acesse este link.

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