Embora o negacionismo científico esteja presente ao longo da história da ciência, nos últimos anos a disseminação de informações pelas plataformas digitais favoreceu o fenômeno, ampliando as discussões em torno de temas como vacinas, mudanças climáticas, evolução ou pandemia da covid-19. Uma pesquisa desenvolvida na UNIFAL-MG investigou as oposições ao conhecimento escolar e científico que ganham espaço nas redes sociais, apontando argumentos utilizados por três movimentos pseudocientíficos: o design inteligente, o terraplanismo e a recusa vacinal.
O estudo é resultado da pesquisa de mestrado do acadêmico Pedro Grandchamp Neto, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UNIFAL-MG, sob a orientação do professor Frederico Augusto Toti (Instituto de Ciências Exatas), em março de 2023.
Pedro Neto explica que o tema já tinha sido trabalhado na sua graduação em História, quando desenvolveu uma monografia sobre a existência dos grupos negacionistas da ciência e ganhou novos contornos na pesquisa de mestrado. “Nos últimos anos, a presença crescente desses grupos em redes sociais e em ambiente escolar me motivou a dar continuidade à pesquisa”, afirma.
“A grande distorção dos conhecimentos científicos, causados pelo negacionismo também nos motivou a realizar o pesquisa”, acrescenta.
Identificar os argumentos utilizados pelo movimento antivacina, bem como os argumentos dos defensores do terraplanismo que sustentam as distorções sobre a natureza das Ciências, foi um dos pontos de partida do estudo.
Para coletar os dados, o acadêmico usou o YouTube e o Facebook como fontes, além de livros que defendem teses negacionistas e distorções do conhecimento científico. Nas redes sociais selecionadas, Pedro Neto usou palavras-chave com o objetivo de encontrar comunidades que defendessem a terra plana e o design inteligente, e que negassem a eficácia das vacinas.
Um dos diferenciais do trabalho foi o fato de a coleta de dados considerar as comunidades brasileiras que tratavam especificamente das pseudociências em questão. “Isso tornou essa pesquisa mais adequada ao problema das pseudociências no contexto do Brasil, enquanto a maior parte da literatura vem de comunidades de língua inglesa ou mesmo é inexistente em alguns segmentos que estudamos”, conta.
A coleta envolveu imagens e vídeos publicados pelos usuários ao longo do ano de 2020, os quais passaram por análise utilizando a metodologia da Etnografia Virtual. “Essa metodologia foi escolhida porque os grupos on-line representam verdadeiras comunidades, com suas próprias particularidades, que se expressam por meios virtuais”, detalha.
O pesquisador identificou características em comum nos três movimentos negacionistas pesquisados e também características distintas. “No que se refere às características compartilhadas entre eles, podemos citar uma forte desconfiança da legitimidade das instituições de pesquisa e ensino do país, além do uso de teorias da conspiração como sustentação de seus posicionamentos”, relata.
Em relação às singularidades encontradas, o acadêmico exemplifica: “Foi possível identificar que cada um dos grupos busca desenvolver argumentos que refutem os campos científicos aos quais se opunham”, explica. “Terraplanistas propõem ideias que expliquem o universo sem a influência da força gravitacional, enquanto os defensores do design inteligente buscam denunciar a evolução biológica das formas de vida como uma mentira da comunidade Científica.”
Os resultados contribuem para compreender de que forma os movimentos negacionistas se adaptam aos novos cenários e aos desenvolvimentos recentes do cotidiano científico e político.
“Profissionais da educação e da ciência se beneficiam de pesquisas como essa, que precisam ser realizadas com certa regularidade para acompanhar os desdobramentos desses movimentos, seus novos argumentos e ideias”, pontua o pesquisador.
A pesquisa completa pode ser acessada no repositório da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UNIFAL-MG, neste link.